
— Filho, Eddi é um bom amigo? Sério mesmo, meu filho, isso é conversa que se tenha no WhatsApp?
Está Sara perguntando para o próprio espelho, ensaiando as perguntas para fazer ao seu único filho, Gabriel, depois de ter lido as mensagens do WhatsApp dele. Atônita, em menos de uma semana, parecia que a vida de Gabriel havia mudado. Muita mensagem esquisita, muita gente sem rosto no perfil e um mar de animes com milhares de figurinhas que só eles entendiam — imagens, memes, expressões.
Enquanto ele tomava banho, ela anotou nomes, tentou entender os símbolos, e o que aquelas mensagens queriam dizer. Não estava perdida — estava devastada, sem saber por onde começar.
— Mãe? O que você está fazendo? — perguntou Gabriel com os olhos arregalados, ao ver a cena incomum.
— Meu filho, senta aqui, que eu preciso falar com você duas coisas. Quer dizer, três.
Gabriel sentou com a escova de dente na boca, o cabelo todo arrepiado e uma bermuda nova — que não era pra usar dentro de casa.
— Filho, veja só… a tecnologia passa por vários momentos e estamos nessa agora que eu, sinceramente, não consigo entender. Não é à toa que sua mãe pegou o celular para ver as conversas. Você só tem 15 anos e não é dono de si ainda. Preciso te orientar ao máximo sobre as informações que você consome. Você tá entendendo o que eu tô dizendo, meu filho?
Gabriel balançou a cabeça, confuso.
— Eu vi que tem dois amigos seus que eu conheço. Mas da última semana pra cá, é tanta gente estranha… Meu filho, que negócio é esse de conversar com gente que nem foto tem no perfil? Atrás de uma conversa boba pode estar um tarado, alguém mais velho, querendo te manipular. Quem é esse Eddi? Por que ele colocou “Aqui se faz, aqui se paga”? Isso é jeito de falar? Ele é do colégio? Do seu jogo? O que está acontecendo?
Gabriel olhou firme pra mãe, cuspiu na pia, tirou a escova da boca e voltou. Viu as lágrimas escorrendo. Segurou o rosto dela entre as mãos e respondeu:
— O Eddi é do nono ano B. Jogamos RPG e o tema é sobre um reality show de empresários. O personagem dele é o chefão. O meu é um advogado com uma empresa quase falida. Tadeu tem um restaurante à beira da falência e Cynthia é uma designer think lutando contra as IAs. O objetivo é resolver os problemas de cada um. Eddi analisa nossas decisões e nomeia o vencedor com base nas atitudes e performances no jogo.
Gabriel pegou o celular.
— Essa frase aqui — “a que se faz, aqui se paga” — foi a provocação da rodada. Era pra pensarmos nas consequências do dia a dia dos personagens e no que podemos fazer para mudar. Ainda estamos tentando descobrir como resolver.
— Mas meu filho… RPG não é sobre elfos, reis e duendes?
Gabriel riu de leve.
— Mas o carrossel que se vive hoje, mãe… Pelo que vejo dos pais, até de você mesma, sempre tentando se atualizar, melhorar, encontrar saídas… decidimos jogar algo muito mais próximo da realidade.
Sara enxugou os olhos, ainda com o coração apertado. Não era medo do jogo… era medo de não conseguir jogar junto com esse mercado em constante mudança.
Gabriel, por outro lado, estava ali, dizendo com todas as letras e entrelinhas: “o mundo mudou, mãe”. E talvez, só talvez, ele estivesse tentando jogar limpo, mesmo num tabuleiro em constante mutação.
Sara então abraçou o filho, disse que continuaria a observá-lo, ele sorriu e foi para a sala, ela olhou para a janela e pensou:
“A vida, afinal, é um jogo… Mas não desses com manual de regras. É um RPG em tempo real, onde os personagens se moldam pelas escolhas e as fases não têm checkpoint. Você pode até não entender todos os códigos, avatares e gírias…
Mas uma coisa continua verdadeira: A forma como encaramos a realidade — com medo, com controle ou com curiosidade — define muito mais do que o presente. Define o que somos dentro dele.
Talvez o segredo não seja vencer o jogo, mas aprender a jogá-lo juntos.
Com coragem, com escuta e, quem diria… com dados na mão e olhos no outro.
Porque pensar com arte é, sim, pensar diferente —
mas viver com arte é aceitar que estamos todos jogando a mesma partida.
Aimée é uma planejadora urbana com mais de 15 anos de experiência em Marketing, consultora de pós-graduação em NeuroMarketing, Artista Visual internacional e CEO da Tkart, uma empresa internacional de marketing.
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