Coluna Crônicas da Cidade

Pai de pet e mãe bebê reborn

Coluna Crônicas da Cidade com Thiago Maroca

Eles se conheceram na aula de beach tênis, cada um na sua categoria, um era não ortodoxo e a outra discípula do mestre Shan kwai, do app mesmo. Bastou terem uma amiga Namastê em comum para darem match, tipo um “gostei de você”. A tal amiga se chamava Teresa Cristina, mas se auto apelidou de Ganesha, uma coisa que tem no hinduísmo, um santo com cabeça de elefante, sabedoria e veganismo, tudo que gente rica entediada gosta. Falando em tédio, assim como o badmínton, o beach tênis parece ser outra criação de rico entediado. Coisa de branco, herdeiro. Mas estamos aqui para falar de amor, que não importa a condição financeira, todos merecem amar.
Foi durante a troca de turnos, Elizabeth (nome e atitudes de rainha) deixou em cima do banco, desprotegida, Lulu, sua bebê. Felipe Carlos, estranhou ao ver uma neném sozinha com olhos abertos e não estar chorando, mesmo não tendo filhos, ele sabia que crianças comem e choram, nessa ordem, o tempo inteiro. Resolveu mexer e disparou a chorar, por um segundo ficou feliz ao saber que a criança ao menos estava viva devido o choro, mas de imediato, os pais não apareceram. Aslam, o cachorro que tem o nome em homenagem ao leão que mostra a porta do guarda-roupa para outro mundo e acaba destruindo a vida de três crianças para sempre, latiu. A mãe da criança apareceu
“Filhinha, o que houve? A mamãe ouviu você chorando e veio correndo lhe ver”
Felipe Carlos, pensou seriamente se era necessário dizer alguma coisa com tal cena esdrúxula, mas seguindo orientações do seu terapeuta holístico, era preciso libertar a criança interior e ali era a materialização da frase. A criança de Felipe colecionava bonecos originais da série animada Cavaleiros do Zodíaco, Felipe queria ser o Chun de andrômeda, que começa sempre chorando e pedindo ajuda ao irmão, mas depois desce as correntadas em todos que estavam rindo dele, o sonho de todo trabalhador brasileiro assalariado.
Eles se olharam e riram, rico não flerta com conversinha mole. Dali mesmo foram tomar um gellato, um sorvete com mais açúcar e água do que o normal, eles colocam no prato para pensarem que é uma refeição. No encontro seguinte fizeram os cálculos e ambos tinham a mesma herança, podiam se juntar sem interesses. Mas a vida é uma caixinha de surpresas. Casaram, viajaram para a França, Itália e todo aquele roteiro europeu que a classe média brasileira gosta. Fotos de casquinha de sorvete na torre de Pisa, cadeado em forma de coração no rio Sena e bacalhau na sopa após visitar o oceanário de Lisboa, a vida do rico é boa.
Na primeira semana morando juntos, os enteados se desentenderam, Lulu, a boneca reborn sentou no meio do sofá, lugar escolhido por Aslam, que não perdia a oportunidade de ficar entre os dois e ganhar um carinho duplo. Os responsáveis pela união daquela nova família precisavam unir os novos irmãos. Fizeram um piquenique. Vinho, queijos, salame, azeitona e um sol de 29 graus. O cúmulo foi quando Elisabeth instruiu a filha a jogar a bolinha para que o filho de Felipe Mauricio pegasse. O cachorro com uma raiva como se tivesse pulga nas orelhas mordeu a boneca e saiu correndo, arremessou- a no lago e depois correu em direção oposta ao casal, se o latido fosse traduzido, estaríamos ouvindo:
“Liberdade!”
Restou ao casal, um pouco de terapia, viagem internacional, cura com cristais, yoga, comerem flores e por fim decorarem a casa com inúmeras plantas doadas pela amiga Ganesha que partia rumo a India para um retiro sem data para voltar.
Ambos tornaram-se pais de plantas.
Dizem que é possível ouvir os latidos de Aslam durante a madrugada.
Fui!

Thiago Maroca é escritor, membro da Academia Valparaisense de Letras, produtor audiovisual, mestre em educação, escoteiro, pai do Théo e uma meia dúzia de coisas que não cabem nesse espaço.
Manda um OI:@thiagomaroca/thiagomaroca@gmail.com

Paula Rocha

Editora chefe do Jornal Diário do Entorno

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