
Karina Bueno
O Ministério Público de Goiás (MPGO), por meio da 6ª Promotoria de Justiça de Luziânia, propôs uma ação civil pública (ACP) contra a Comunidade Terapêutica Tribo de Judá Ltda., sua sócia Cris Raiane de Almeida Oliveira e o representante da unidade, Tiago de Morais Araújo, em razão de diversas irregularidades identificadas no local.
Segundo o promotor de Justiça Julimar Alexandro da Silva, titular da 6ª PJ, propositor da ação, em fevereiro deste ano foi realizada uma inspeção sanitária na comunidade, conhecida como SPA Terapêutico, na qual foram encontradas várias situações que violam as normas sanitárias.
Entre as irregularidades encontradas foram destacadas a falta de alvará sanitário de funcionamento, infiltrações, mofos, paredes sem reboco, fiações elétricas expostas e banheiros sem condições de uso. No momento da vistoria, estavam acolhidos no local 43 residentes, todos do sexo masculino, sendo que dez deles são idosos e com várias comorbidades. Segundo Julimar Alexandro, muitos dos internos eram pessoas com transtornos decorrentes de substâncias psicoativas, esquizofrenia e em recuperação após acidentes.
A grave situação sanitária encontrada acabou gerando a interdição administrativa da unidade. Agravando ainda mais a situação, foi constatado que boa parte dos internos estava no local de forma involuntária, sendo que seus familiares pagavam cerca de R$ 1,3 mil por mês para mantê-los internados.
Comunidades terapêuticas não têm autorização para internações involuntárias
O promotor ressalta que “as comunidades terapêuticas não têm autorização legal para realizar internações involuntárias ou compulsórias. Ainda que o paciente, com laudo médico, se apresente espontaneamente para tratamento, se, após determinado período, não mais demonstrar interesse em lá permanecer, deve ser desligado do tratamento, já que a continuidade deste implicaria em imposição”. Nesse sentindo, o promotor destaca o previsto na Lei 13.840/19, em seu artigo 23-A, que especifica que a internação de pessoas que fazem uso de drogas, ainda que voluntária, somente será realizada em unidades de saúde ou hospitais gerais dotados de equipes multidisciplinares.
Segundo o promotor Julimar Alexandrino, o responsável pela comunidade, Tiago de Morais Araújo, a partir da interdição cautelar do local, providenciou a transferência dos acolhidos para outras instituições regularizadas ou para seus familiares, ficando sob a responsabilidade da Secretaria de Assistência Social somente um idoso sem familiar, o qual foi transferido para outra comunidade terapêutica, e outro indivíduo que, cujos familiares são do Estado da Bahia, foi encaminhado para uma clínica de Luziânia.
Diante do exposto, o MP requereu tutela de urgência, por meio de liminar, a fim de determinar: a interdição total e imediata da Comunidade Terapêutica Tribo de Judá Ltda., impedindo que ela volte a funcionar, ainda que sob o uso de outro nome empresarial; que a sócia Raiane de Almeida e o responsável Tiago Morais não voltem a exercer qualquer atividade ligada ao tratamento de pessoas com transtornos mentais; que a entidade providencie a entrega dos documentos e pertences eventualmente guardados e em sua posse a todos os acolhidos.
Por fim, o MP sugere que seja fixada multa diária no valor de R$ 5 mil para caso de eventual descumprimento da ordem judicial que seja determinada, revertida ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados, previsto no artigo 13 da Lei 7.347/85, sem prejuízo de eventual apuração de responsabilidade.
Importância da comunidade terapêutica
A comunidade terapêutica é uma instituição que oferece acolhimento e tratamento para pessoas com problemas relacionados ao uso abusivo de álcool e outras drogas. Elas funcionam em regime residencial, com permanência voluntária e por um período geralmente de 6 a 12 meses.
A regulamentação das comunidades terapêuticas no Brasil é feita por diferentes órgãos, mas o principal marco legal é a Resolução RDC n° 29, de 30 de junho de 2011, da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que estabelece que comunidades terapêuticas são “serviços residenciais destinados a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas, que adotam a abstinência como forma de tratamento e utilizam o convívio em grupo como ferramenta terapêutica.”
A referida resolução estabelece também que: a adesão seja voluntária – o acolhimento só pode ocorrer com o consentimento livre do acolhido; abstinência – tem o foco em interromper totalmente o uso de drogas e álcool; quanto a equipe técnica – não é obrigatório ter médicos em tempo integral, mas deve haver acesso a profissionais qualificados (como psicólogos, assistentes sociais e terapeutas); que Plano Terapêutico Individual (PTI) – cada acolhido precisa ter um plano de tratamento individualizado e ao se tratar sobre os direitos humanos é proibido qualquer tipo de castigo, maus-tratos, trabalho forçado ou privação de liberdade.
Sendo recomendado também de permanência entre 6 a 12 meses, podendo ser prorrogado, sempre com consentimento.