Coluna Empreender

A arte de chamar tudo de arte

Coluna Empreender com Aimée Resende

Nos últimos dias, me peguei incomodada por algo que, à primeira vista, parecia apenas mais uma expressão corriqueira: a arte da estratégia, a arte de empreender, a arte de fazer acontecer. Três cliques em qualquer rede social e lá está ela: a palavra “arte” utilizada como selo de profundidade, como se bastasse incluí-la para elevar o valor de qualquer ação. Mas será que estamos falando mesmo de arte? Ou será só uma embalagem bonita para algo que, no fundo, perdeu a essência?
Comecei a reparar que todo início de semana, talvez por conta do peso simbólico que ela carrega de recomeço, produtividade e superação, vem carregada de frases motivacionais, dicas infalíveis, empurrões disfarçados de incentivo. “Vai dar certo”, “confia no processo”, “você nasceu pra isso”… Tudo soa meio repetido. Uma colagem de palavras coladas no tempo, que nos alcança mais como ruído do que como reflexão. Mesmo quando a intenção é boa, parece que estamos sendo levados por um automatismo de crenças recortadas. E a tal da “arte” entra nesse contexto como se fosse um tempero universal: arte de liderar, arte de comunicar, arte de vender, arte de planejar. Mas que arte é essa?
Não estou falando da arte de Da Vinci, da leveza dos impressionistas, do delírio barroco, do rasgo brutal do expressionismo. Não me refiro ao traço do artesão, ao canto ancestral ou ao movimento coreografado que faz o corpo virar palavra. Estou falando da arte que virou ferramenta de marketing. Do uso da palavra como recurso para seduzir, para vender cursos, métodos, produtos. Arte como fórmula. Como selo de autenticidade. Como truque de linguagem.
É claro que toda ação humana carrega, em alguma medida, um gesto criativo. Mas isso é diferente de chamar tudo de arte. Quando tudo vira arte, o que sobra de fato como arte? Essa é a pergunta que me provocou.
Talvez o que me irrite não seja o uso da palavra, mas o esvaziamento dela. Porque se arte é estratégia, planejamento, execução e resultado, então onde fica o erro? Onde fica o espanto? Onde se esconde o mistério, o desconcerto, a possibilidade de fracasso que também compõe a beleza de criar?
A arte, no seu sentido mais profundo, é o lugar onde as perguntas moram. Ela não está preocupada em te dar um plano de ação em cinco passos. Ela é aquela presença que te convida ao risco, ao desvio, ao incômodo. Ela não se importa se você vai vender mais, performar melhor, alcançar metas ou dobrar o faturamento. Arte, de verdade, se importa em te atravessar. Em fazer você sair diferente do que entrou.
Mas o que temos hoje é um discurso sedutor que empilha palavras bonitas para esconder o vazio. Chamar de “arte” um processo puramente técnico ou mercadológico não o torna mais profundo. Apenas o embala melhor. E talvez seja justamente isso que me pega: a forma como estamos embalando tudo, o tempo todo, para parecer mais do que é.
Existe, sim, uma beleza em planejar. Existe sensibilidade na estratégia. Existe poesia no empreender. Mas nem tudo precisa ser chamado de arte para ser valioso. Existe valor no que é técnico, no que é objetivo, no que é metódico. E reconhecer isso sem tentar romantizar tudo talvez seja o primeiro passo para reencontrarmos a autenticidade.
No fim das contas, talvez eu só esteja cansada de tanta palavra com capa dourada. Talvez a arte, nesse mundo que corre sem pausa, seja justamente o que escapa das fórmulas. Talvez ela esteja no silêncio entre uma tarefa e outra. Talvez na pausa do café mal passado de segunda-feira. Talvez na dúvida. Talvez no que não tem nome ainda.
E talvez, só talvez, a maior arte que nos falta seja a de parar. Respirar. E perguntar, com coragem e sem pressa: isso aqui é mesmo arte ou só parece ser?

Pensar com Arte é Pensar Diferente.

Aimée é uma planejadora urbana com mais de 15 anos de experiência em Marketing, consultora de pós-graduação em NeuroMarketing, Artista Visual internacional e CEO da Tkart, uma empresa internacional de marketing.
www.tkarteiros.com
contato@tkarteiros.com
7999121-0775
@tkart_idea

Paula Rocha

Editora chefe do Jornal Diário do Entorno

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