Novo Código Civil: projeto trata de uso de IA e regras para big techs
Proposta estabelece normas sobre o direito digital, a criação de sistemas de inteligência artificial e obrigações para plataformas digitais

O marco regulatório da inteligência artificial no Brasil está em fase de análise na Câmara dos Deputados, mas também vem sendo discutido no Senado como parte do novo Código Civil. O projeto de reforma visa estabelecer regras claras sobre o uso de sistemas de IA e as responsabilidades das plataformas digitais, incluindo as grandes empresas de tecnologia, conhecidas como big techs.
A proposta, elaborada por uma comissão de juristas e apresentada em janeiro pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), busca criar um ambiente mais seguro e transparente para o desenvolvimento e uso de inteligência artificial, além de unificar as normas sobre o direito digital no país. Uma comissão especial deve analisar o texto antes de sua possível votação.
Regras para o uso de inteligência artificial
Entre os pontos destacados no projeto, está a obrigatoriedade de que o uso de IA na prestação de serviços digitais seja claramente identificado aos usuários, de forma ética e com base nos princípios da boa-fé e da função social do contrato. Além disso, o desenvolvimento de sistemas de IA deve respeitar os direitos de personalidade previstos no Código Civil, como o direito à privacidade, à imagem e ao nome, para garantir a segurança e a confiabilidade dessas tecnologias.
O projeto também estabelece que os sistemas de IA devem seguir critérios de acessibilidade, transparência, rastreabilidade, além de contar com supervisão humana e governança adequada. Essas regras visam assegurar que as aplicações de inteligência artificial operem de forma ética e responsável, sem prejudicar os direitos dos usuários ou gerar riscos à sociedade.
Direito digital e responsabilidade das plataformas
A reforma proposta busca consolidar as normas relativas ao direito digital, incluindo a proteção de dados e informações pessoais. Os prestadores de serviços digitais, como plataformas de redes sociais e mecanismos de busca, terão o dever de adotar medidas para proteger as informações de seus usuários, sob pena de responsabilização em casos de vazamento ou uso indevido de dados.
As big techs, como Meta, Google e outras plataformas de grande alcance, terão obrigações específicas, como a implementação de diretrizes de moderação de conteúdo e ações para evitar a circulação de material ilícito. Além disso, deverão realizar avaliações anuais de riscos sistêmicos e auditorias independentes, custeadas pelas próprias empresas, para verificar o cumprimento das obrigações estabelecidas.
No que diz respeito à responsabilidade civil e administrativa, o projeto prevê que as plataformas poderão ser responsabilizadas por danos causados por terceiros em conteúdos veiculados em suas redes. Caso descumpram sistematicamente as regras, poderão responder por reparações e sanções legais.
A importância da regulamentação
Segundo a advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, a regulamentação do uso de IA e das redes sociais é uma necessidade urgente. Ela destacou à CNN que episódios recentes envolvendo desafios na internet, que resultaram na morte de crianças, reforçam a importância de estabelecer regras mais rígidas para plataformas digitais.
“Não há motivo para deixar essa discussão de lado. O Código Civil precisa refletir a realidade digital e proteger os cidadãos de possíveis riscos”, afirmou.
Herança digital e novas fronteiras legais
Outra inovação do projeto é a introdução do conceito de “herança digital”, que abrange o patrimônio eletrônico de natureza econômica, como moedas digitais, criptoativos e pontos de programas de fidelidade, como milhas aéreas. O texto propõe que, em caso de falecimento, o acesso a mensagens privadas armazenadas virtualmente só poderá ocorrer mediante autorização judicial e com orientação prévia do titular, garantindo a privacidade mesmo após a morte.
O relator da comissão de juristas, Flávio Tartuce, ressaltou a urgência de atualizar a legislação para abarcar esse novo universo digital. Segundo ele, o Código Civil atual é obsoleto nesse aspecto, não abordando contratos digitais, heranças digitais ou ativos virtuais de forma adequada.
Perspectivas
A discussão sobre o novo Código Civil e suas implicações para o direito digital, IA e responsabilidade das plataformas é considerada um passo importante para modernizar a legislação brasileira e acompanhar as inovações tecnológicas. A expectativa é que, com regras mais claras, seja possível garantir maior segurança e transparência para usuários e empresas no ambiente digital.
*Com informações da Agência Reuters