Crônicas

O ipê e cerejeira

Crônicas da Cidade com Thiago Maroca

Eu nunca vi um pé de cereja, falando sério, eu nunca comi cereja de verdade. Dizem que essa cereja que colocam no sorvete é doce de chuchu. Não tem problema, eu tenho como referência no paladar, aquelas balas grudentas em forma de guarda-chuva que o moço vendia na bicicleta. A gente chupava, mastigava e o vidro de açúcar puro não derretia, o critério era apenas escolher a cor, já que o sabor era sempre o mesmo: açúcar queimado.

A cerejeira no Brasil tem mais na região sul, suas frutas muitas vezes não lembram as que são desenhadas nos cadernos ou nos animes, até porque sua origem é japonesa. A gente que mora no cerrado tem um quê de metido e tenta plantar de tudo, eu já vi pé de Araucária, de Jambo, Parreiras e até Macieira. Tô falando isso porque ouvi um boato de que iriam começar a plantar cerejas no Centro oeste, mas acho que o clima não é muito favorável. Você já pensou que uma planta de região úmida, do nada, resolve viver em um lugar que durante quatro meses lembra o deserto do Saara? Por aqui, meu amigo, a única beleza na seca são as flores dos ipês.

Os ipês fazem sombra o ano inteiro, mas quando começa o período da seca ele resolve aflorar, se exibir e nós já nos acostumamos com isso. É bonito demais. Agora vai tentar plantar um ipê em outra região para ver se ele aflora como aqui. Ele até vinga, mas o espetáculo é diferenciado na nossa região.

Durante minha curta temporada no supermercado, já que não posso esbanjar nos itens da cesta básica e nem no supérfluo. Fico apenas de olho no preço da carne, mas sempre levando frango. Ao lado dos itens de churrasco (que eu amo) tem carvão e agora até lenha eles vendem e adivinhe? Lenha de cerejeira. Tão plantando, regando e cortando a pobre da árvore. Eu pensei que só fizessem isso com os eucaliptos. Churrasco com carvão era o normal, mas a moda agora é fazer fogo com lenha. Daqui a pouco vão voltar a utilizar o papel para escrever. Onde esse mundo vai parar?

Eu plantei um ipê tem pouco mais de um ano em uma praça pública da minha cidade, daqui a um tempo espero ver ele crescer e florir, deixar todo o chão coberto com suas flore e tudo isso durará menos de uma semana. A brevidade da beleza do Ipê nos ensina que devemos nos preparar para o nosso momento de florir e deixar a vida seguir seu caminho, seja o percurso sereno de um rio ou torto como as árvores do cerrado. Já a cerejeira que não consegue vingar seus frutos em qualquer lugar, nos deixa uma breve lição de que cada coisa tem o seu lugar para acontecer, seja aqui ou no Japão.
Daqui vou seguindo, caminhando sob a sombra dos ipês imaginando o sabor real de uma cereja.
Beijo, gente!

Thiago Maroca é escritor, membro da Academia Valparaisense de Letras, produtor audiovisual, fotógrafo, mestre em educação, escoteiro, pai do Théo e uma meia dúzia de coisas que não cabem nesse espaço.
Manda um OI:@thiagomaroca/thiagomaroca@gmail.com

Paula Rocha

Editora chefe do Jornal Diário do Entorno

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